IRREVERÊNCIA E DESPRETENSÃO

Padrão

11/10/15

Irreverência:

Diz-se o que se quer, o que se pensa

Não pensa no que se diz nem no que pensam

De si

Sem maneiras emolduradas

Faz-se o que acha que deve

Sem olhar para os lados

Há aplausos?

Às vezes

Outras críticas atrozes

Despretensão:

Faço

Não me preocupo com o que virá

Se já veio, se foi, se será

Agrada-me ser simplesmente

Sem pretender alcançar isso

Ou se aquilo acontecer, que me surpreenda

Tudo fica mais leve

Mais fluido

Confortável… ameno.

Publicidade

“PRECISA-SE DE POETAS”- 11/10/15

Padrão

Vi esta maravilha de banner, ontem, no Parque Lage. Uma procura bem interessante e inusitada para esses tempos modernosos. Gostei.

Talvez o poeta seja realmente a maior necessidade de nossos tempos. Falta poeta. Faltaria também a poesia? Acho que a poesia está aí, solta, diluída às vezes, concreta ou abstrata, mas sempre a velha poesia.

Assunto não falta para se fazer poesia. É envolver-se na trama do cotidiano que até coisas tristes, quando tratadas por poetas, ficam palatáveis.

Saudades dos poetas.

Sonhadores. Loucos. Distraídos. Maravilhosos.

Vão lá. No Parque Lage estão precisando de vocês.

EU QUERO UMA ALEGRIA… 21/04/15

Padrão

Eu quero uma alegria,

Eu preciso de uma alegria.

Não falo de risos nem de gargalhadas

Falo de uma alegria leve, espontânea, corriqueira

Porém presente… sempre.

Uma alegria com gosto de rio perene,

De água nascente que não sabe aonde vai dar.

Águas tranquilas como no rio de antigamente

Que não se tinha medo de acabar

Quero uma alegria criança, que seja adulta

Que sorria para mim, mesmo que eu não veja motivo,

Porque a alegria não precisa ter motivo.

Quero a alegria de um sorriso maroto,

Que me inunde o ser inteiro, que me faça vibrar

De alegria.

Ivete Adavaí

AUTOPSICOGRAFIA

Padrão

(FERNANDO PESSOA)

O POETA É UM FINGIDOR.

FINGE TÃO COMPLETAMENTE

QUE CHEGA A FINGIR QUE É DOR

A DOR QUE DEVERAS SENTE.

E OS QUE LEEM O QUE ESCREVE,

NA DOR LIDA SENTEM BEM,

NÃO AS DUAS QUE ELE TEVE,

MAS SÓ A QUE ELES NÃO TÊM.

E ASSIM NAS CALHAS DE RODA

GIRA, A ENTRETER A RAZÃO,

ESSE COMBOIO DE CORDA

QUE SE CHAMA CORAÇÃO.

SONETO DA SEPARAÇÃO

Padrão

(VINÍCIUS DE MORAES)

DE REPENTE DO RISO FEZ-SE O PRANTO

SILENCIOSO E BRANCO COMO A BRUMA

E DAS BOCAS UNIDAS FEZ-SE A ESPUMA

E  DAS MÃOS ESPALMADAS FEZ-SE O ESPANTO.

DE REPENTE DA CALMA FEZ-SE O VENTO

QUE DOS OLHOS DESFEZ A ÚLTIMA

E DA PAIXÃO FEZ-SE O PRESSENTIMENTO

E DO MOMENTO IMÓVEL FEZ-SE O DRAMA.

DE REPENTE, NÃO MAIS QUE DE REPENTE

FEZ-SE DE TRISTE O QUE SE FEZ AMANTE

E DE SOZINHO O QUE SE FEZ CONTENTE.

FEZ-SE DO AMIGO PRÓXIMO O DISTANTE

FEZ-SE DA VIDA UMA AVENTURA ERRANTE

DE REPENTE, NÃO MAIS QUE DE REPENTE.

MOTIVO

Padrão

(CECÍLIA MEIRELES)

EU CANTO PORQUE O INSTANTE EXISTE

E A MINHA VIDA ESTÁ COMPLETA.

NÃO SOU ALEGRE NEM SOU TRISTE:

SOU POETA.

IRMÃO DAS COISAS FUGIDIAS,

NÃO SINTO GOZO NEM TORMENTO.

ATRAVESSO NOITES E DIAS

NO VENTO.

SE DESMORONO OU SE EDIFICO,

SE PERMANEÇO OU ME DESFAÇO,

– NÃO SEI, NÃO SEI. NÃO SEI SE FICO

OU PASSO.

SEI QUE CANTO. E A CANÇÃO É TUDO.

TEM SANGUE ETERNO A ASA RITMADA.

E UM DIA SEI QUE ESTAREI MUDO:

– MAIS NADA.

HÁ UMA HORA CERTA

Padrão

(GUIMARÃES ROSA)

Há uma hora certa,
no meio da noite, uma hora morta,
em que a água dorme.

Todas as águas dormem:
no rio, na lagoa,
no açude, no brejão, nos olhos d’água,
nos grotões fundos
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir…

Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.

O orvalho sonha
nas placas da folhagem
e adormece.
Até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes…

Mas nem todas dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono…

Guimarães Rosa

Nota
“Sou composta por urgências: minhas alegrias são intensas; minhas tristezas, absolutas. Me entupo de ausências, me esvazio de excessos. Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos.” (Clarice Lispector)

 

ESTOU AQUI…

Padrão

EU E AS PEDRAS

AS PEDRAS E AS ÁGUAS… E O MUSGO…

AS ONDAS BATEM RITMICAMENTE

ACOMPANHANDO O CORAÇÃO DA TERRA

E O MEU TAMBÉM.

SEMPRE ME PERGUNTO:

COMO O TEMPO PASSOU TÃO DEPRESSA?

AINDA ONTEM EU ERA UMA MENINA

DEPOIS UMA JOVEM ADOLESCENTE,

AGORA, UMA MULHER QUE SE ENCAMINHA

PARA A IDADE DA SABEDORIA…

NO ENTANTO, EU SINTO QUE DENTRO DE MIM

ESTÃO TODAS AS PESSOAS QUE FUI E SOU…

A MENINA, A ADOLESCENTE, A JOVEM MULHER…

OS PLANOS, AS ESPERANÇAS, OS DESEJOS, AS ALEGRIAS,

AS LUTAS, O ESTRESSE, A BUSCA, O ENCONTRO,

A DECEPÇÃO, A ESPERANÇA, O QUE DEU CERTO

E O QUE PARECE NÃO TER DADO…

SOU UM MIX DE TUDO E UM POUCO DE TODOS,

EM LUGAR DISTANTE QUE JAMAIS PLETEEI CONSCIENTEMENTE.

A VIDA CONTINUA DO JEITO QUE É PRA SER…

DO JEITO QUE DÁ…

EU SIGO, VEZES CANSADA, OUTRAS ANIMADA

VENDO O MAR BATENDO NAS PEDRAS,

SENTINDO OS RESPINGOS NO MEU ROSTO

E ME DOU CONTA DE QUE EU VIM AQUI PARA ISTO:

EXPERIMENTAR UMA EXISTÊNCIA NO PLANETA AZUL.